Stones em Praga: Incrível noite de Rock ‘N Roll
Rock 'N Soul Ritual in Prague!
Faltando 23 dias para o show dos Rolling Stones no Letná Park completar 15 anos, a maior banda do mundo retornou à cidade de Praga pela primeira vez após a “Licks Tour”, quando fizeram um show realizado em 27 de julho de 2003. Já em relação ao país o jejum é menor, a última vez da banda na República Checa havia sido em 22 de julho de 2007, quando tocaram no Exhibition Centre, em Brno, durante a “A Bigger Bang Tour”. Praha teve o privilégio de receber os Stones mais uma vez, mas antes de receber a maior história do Rock ‘N Roll, o público aproveitou um show de um grupo da Suíça chamado Gotthard, que apesar do som pesado, tem uma grande veia comercial. A banda conseguiu arrancar uma reação do público dos Stones, literalmente fizeram os stoneanos cantar suas canções. Em seguida subiu ao palco o segundo ato de abertura da noite, a banda tcheca Pražský výběr, que está completando 40 anos de sua primeira formação em 2018. O Pražský výběr é uma banda de Rock Progressivo e Jazz Fusion, o que resultou na inusitada situação onde as duas bandas de abertura são adeptas de formas de fazer Rock que não são as preferidas de Keith Richards.
Horas antes do show, Keith e sua família, Bernard Fowler e Darryl Jones, estavam em um cruzeiro por Praga. “Um lindo dia no Rio Vltava, aproveitando Praga com meus amigos e família”, disse o músico em seu Instagram.
O público já lotava o Letňany Airport durante os shows dos atos de abertura, mas do lado de fora do Letňany, fãs que não tinham ingresso dava uma inevitável espiada pela cerca que demarcava a área do show. “Estima-se que 1.000 pessoas estão atrás da cerca e ouvindo. Eles têm assentos, um trouxe uma escada”, escreveu um fã no Twitter.
Os fãs que se aglomeraram foram do Letňany até compraram lembranças do show, como os copos oficiais da turnê. Mas nem tudo foi alegria, os pagantes reclamaram de transporte superlotado, além de tudo estar muito caro no local do show. Mesmo assim, nada estragaria a alegria dos tchecos, os mais de 50 mil pagantes foram à loucura quando a banda foi anunciada.
Charlie aquecendo em seu camarim, conhecido como “Cotton Club” antes do show
A cada show os Stones mostram o motivo pelo qual escolheram “Street Fighting Man” para abrir os shows da “No Filter” em 2018, a noite de Rock ‘N Roll começou furiosa com o clássico de 1968, “It’s Only Rock ‘N Roll (But I Like It)” teve uma interpretação um pouco diferente de Keith para o lick clássico influenciado por Chuck Berry, abandonando as primeiras notas que geralmente faz, uma exclusividade para os tchecos. Richards também introduziu solos diferentes do que vem fazendo na atual turnê, pelo visto não é só em “Satisfaction” que o guitarrista encontra algo novo a cada concerto. Até licks que aparecem em “Carol” reapareceram na “It’s Only Rock ‘N Roll” de quarta-feira (4). Apesar do público europeu não ser tão empolgado quanto o brasileiro ou o estadunidense, os mais de 50 mil pagantes foram à loucura em “Tumbling Dice”, a plateia no Letňany se envolveu mais na faixa do “Exile On Main St” do que outras que assistiram ao clássico em datas anteriores da atual turnê, algo lindo de se ver.
“Ride ‘Em On Down” é sempre bem executada pelo Stones, mas em Praga, o cover de Eddie Taylor esteve em excelente forma, Ronnie Wood estava impiedoso no solo, e como o mesmo disse em uma entrevista para promover o “Blue & Lonesome”: “Os Rolling Stones são uma banda de Blues”.
O setlist acabou vazando minutos antes do show começar, conforme as canções eram executadas pelos Stones, veio a confirmação de que a foto era real. Mas em relação ao song vote, era claro desde o começo que “Under My Thumb” iria ganhar. A canção, que apareceu no set fixo tanto em 2017 quanto em 2018, faz parte do disco mais vendido dos Stones nos EUA, a coletânea “Hot Rocks”, assim fica difícil para os outros clássicos. Raridades ou sucessos tocados com menos frequência perdem ainda mais as chances de aparecer no set com a inclusão do cover de “Like A Rolling Stone”, embora a banda esteja se saindo muito bem nas performances do clássico de Bob Dylan, o motivo pelo qual a música tem retornado. Ambas estavam em ótima forma no show de Praga, antes de “Under My Thumb”, Mick brincou sobre querer cantar a folclórica canção tcheca “Pec nám spadla”. Já “Like A Rolling Stone” foi recebida pelo público como uma das favoritas, foi um dos momentos de maior empolgação da noite.
Jagger segue bem afinado em “You Can’t Always Get What You Want”, a plateia estava incrivelmente em sintonia com o frontman, o que não mudou em “Paint It Black”, outro clássico que estava em uma boa noite durante o concerto no Letňany. O vocalista seguiu fazendo a inteligente harmonia com Bernard Fowler e Sasha Allen em “Honky Tonk Women”, que sempre é seguida pela apresentação de todos que estão no palco. Keith assumiu os vocais em “You Got The Silver”, clássico para o qual deu uma das melhores interpretações já vistas durante a “No Filter”. Guardando as notas altas apenas para o fim da canção, Richards fez mais do que bonito durante a faixa do “Let It Bleed”. O set de Keith continuou trazendo “Before They Make Me Run”, que apareceu com frequência também na primeira leg da excursão. O guitarrista passou noites em claro gravando a música, tem mais é que tocar mesmo. Durante a faixa do “Some Girls”, outra boa interpretação de Keef, que tem feitos solos com mais agilidade a cada show de 2018. “Sympathy For The Devil” veio logo em seguida. Majestoso, Mick Jagger retornou ao palco para uma impactante performance, enquanto Richards se mostrou mais ligado e (novamente) ágil nos solos, uma das melhores “Sympathy” de toda a tour.
“Miss You” continua sendo um dos pontos altos do show, Charlie Watts sempre eleva sua elegância na balada Disco dos Stones. Um raro erro durante a música aconteceu em Praga, antes do verso “Oh, baby why you wait so long”, Mick continuou na parte anterior e os backing vocals foram juntos, na segunda vez, o frontman corrigiu a situação, mas o invés de dizer “come on” duas vezes, cantou o verso anterior novamente, o que foi estranho. Duas possibilidades: Mick não queria deixar o público tcheco sem os dois versos e achou que a banda o acompanharia na prolongação, ou ele estava sem retorno naquele momento. Após isso, a música correu sem maiores problemas, com ótimos solos de Darryl Jones e Tim Ries. “Midnight Rambler” continua sendo a grande explosão da noite, Ronnie continuava impiedoso no heavy blues dos Stones, o caçula estava cheio de energia, pra variar. Mick Jagger até entoou os primeiros versos de “You Gotta Move”, canção gospel que encontrou seu caminho para o “Sticky Fingers” com uma interpretação dos Stones inspirada na versão de Fred McDowell.
Fazendo a intro de “Start Me Up” sem dificuldade alguma, Richards inicia a música que anuncia a reta final do concerto, Jagger teve um mínimo problema com a letra antes do solo de Ronnie, mas os teleprompters estão lá por uma razão, após uma rápida olhada, o vocalista se recuperou. Já “Jumpin’ Jack Flash” teve uma performance “redondinha”, sem tirar nem pôr, a enérgica música teve uma de bela interpretação em Praga, mesmo com Charlie não tocando a caixa após o refrão, ou deixando a força apenas para o riff da música, talvez Watts esteja entrando na onda de Keith de encontrar novas formas de interpretar, já que em alguns momentos é possível perceber o baterista deliberadamente tocando o hi-hat junto dos pratos ao invés da caixa. E os dias de sofrência quase voltaram para a intro de “Brown Sugar”, a parte de Ronnie por pouco não saiu na Danelectro ’64, guitarra com a qual ele não se entendeu muito bem em alguns shows do ano passado. E aconteceu o que já conhecemos, quando Wood quase se perde, Richards quase se perde e por pouco a introdução não vai por água abaixo. Mas os dois estão bem mais espertos com relação a isso, tudo foi mantido sob controle para a satisfação dos mais de 50 mil presentes, que assistiram à uma “Brown Sugar” com um tempo maior do que o habitual para a “No Filter” em 2018, mais de 6m30s do clássico para os tchecos.
Os Stones voltaram para o palco ao som de “Gimme Shelter”, música na qual Jagger fez uma economia de notas atípica durante os versos, mas que funcionou muito bem, talvez até melhor do que o vocalista costuma fazer. Sasha Allen também economizou algumas notas em sua difícil tarefa de cantar a parte de Merry Clayton depois de quase 2 horas usando a voz. Allen também brilhou em uma interpretação forte da letra com Mick após seu momento solo, uma performance quase dramática que ganhou o gosto de quem assistia.
“(I Can’t Get No) Satisfaction” chega para encerrar o penúltimo show da “No Filter”, o clássico muitas vezes visto como o maior do Rock ‘N Roll, mostrou os Stones em grande forma por quase sete minutos, até que os fogos de artifício tomam os céus para anunciar o fim de mais uma incrível noite na história dos Rolling Stones.
E aqui está Mick e sua versão de “Pec nám spadla”...
Foto: Lukáš Bíba
Setlist:
1. Street Fighting Man
2. It's Only Rock 'N Roll (But I Like It)
3. Tumbling Dice
4. Ride 'Em On Down (Eddie Taylor cover)
5. Under My Thumb (vote song)
6. Like A Rolling Stone (Bob Dylan cover)
7. You Can't Get Always Get What You Want
8. Paint It Black
9. Honky Tonk Women
10. You Got The Silver (Keith)
11. Before They Make Me Run (Keith)
12. Sympathy For The Devil
13. Miss You
14. Midnight Rambler
15. Start Me Up
16. Jumpin' Jack Flash
17. Brown Sugar
BIS 18. Gimme Shelter
19. (I Can't Get No) Satisfaction
Foto: The Rolling Stones